domingo, 20 de janeiro de 2013

Chinelo, o empresário



Terceiro ano de faculdade. Seu curso não metia mais medo, as matérias eram difíceis, mas ele sabia que aguentaria. O cabelo comprido e a namorada que fazia biologia o encorajavam ainda mais a acabar logo com o curso. Ainda mais agora que havia comprado um carrinho usado com o dinheiro das aulas particulares, sabia que precisava seguir logo o caminho do trabalho.

E o melhor de tudo, havia se livrado de seu companheiro – sua pedra no sapato, na verdade – Chinelo, aquele cara que achava que pra passar na faculdade era só dar um jeitinho, fazer qualquer coisa bizarra nas provas e se dar bem no fim do semestre.

Sua primeira impressão é que aquele ano não seria difícil, apesar da recomendação e da quantidade de veteranos que faziam as matérias pela segunda vez. Havia gostado em especial de um professor. Sua filosofia era interessante:

- O mais importante da minha matéria é que o aluno saiba se sobressair às dificuldades. É somente isso que ele precisa para crescer em uma grande empresa.

Assim começou. Ele percebeu que os que faziam o curso novamente estavam certos. Cálculos, planilhas de custo e receita, impostos etc. 2 semanas e ele estava na mesma situação de sempre. Não sabia nada. 1,5 na primeira prova:

- Professor, estamos tendo muitas dificuldades com sua matéria nesse semestre, o senhor poderia nos ajudar?
- Caro amigo, lembre-se: o mais importante é que o aluno saiba se sobressair às dificuldades encontradas. Pense nisso.

Tentou se sobressair, mas não deu. Foi enterrado! 1,5 novamente. E pra piorar encontrou no dia da prova o Chinelo: - Calma, nessa matéria tudo se resolve, eu mesmo nem me matriculei esse ano porque é tudo muito tranquilo...

Seu misto de raiva e desespero o acompanharam até a terceira prova. Naquela manhã desmarcou suas aulas particulares, juntou-se com os amigos na biblioteca. Ganhou confiança: - Agora vai.

Novamente da série tradicional não se sabe por que acontece: faltando 20 minutos pra prova, aparece o Chinelo, completamente preocupado:
- Acabei de descobrir que estou matriculado nessa matéria! Você pode me ensinar, que tal?

Riu. Gargalhou. Como conseguiria em 20 minutos? Porém sua quase vocação de professor não ia deixar o rapaz da sandália:
- Vamos fazer juntos esse primeiro exercício. O que você conseguir associar com a prova está ótimo!
- Maravilha, vou decorar esse exercício na íntegra.

Claro que ele sabia que não ajudaria, mas a cara de felicidade do descalçado era evidente, nem valeria a pena contrariá-lo.

E chegou a hora. Pelas caras de todos aos 10 minutos de prova já soube. Era zero na certa. Ao ler a prova, resolveu que era melhor esperar o tempo mínimo pra sair e entregar em branco, seria menos humilhante.

Estranhamente o Chinelo fazia a prova loucamente. E escreveu muito, pediu até uma folha adicional. Foi o último a sair. Saiu feliz, com a cara do empresário que fechou seu maior negócio da vida.

Dia de entrega de notas. Até o gato de estimação da faculdade estava triste. Sabia que não havia conseguido. Ouviram o sermão:

- Gostaria de dizer que muitos de vocês não souberam se sobressair às dificuldades, por isso não conseguiram passar. Porém preciso fazer uma menção honrosa a esse rapaz, que terá um futuro brilhante em qualquer empresa. E apontou o Chinelo.

- Você, meu filho, será um dos maiores. Qualquer dificuldade será vencida, gosto muito de seu estilo. Nota 10!

Eis a prova do sem sapato: Professor, esse exercício da prova eu não sei, mas esse aqui eu sei.Copiou o enunciado e a resolução do problema que havia aprendido 20 minutos antes. O professor amou, achou que isso sim era a demonstração de força do futuro empreendedor.

Mais uma matéria perdida. E o valeu pela ajuda, hein! ? Teve certeza que deveria ter virado hippie...

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